Sustos

Tinha eu 3 anos – a idade da Caetana agora – quando me perdi dos meus pais, à noite, em pleno algarve, num sítio repleto de poços e piscinas abertas.

Estávamos num restaurante. O meu irmão – 22 meses mais novo – estava cheio de febre e a minha mãe levou-nos aos dois para o carro.

Eu, não estando doente, implorei imenso para que me deixasse voltar para o restaurante. Os meus pais só tinham 1 telemóvel para ambos e, na altura, não se faziam chamadas a torto e a direito.

A minha mãe, com um bebé a chorar de doente e uma criança a chorar de estar farta, deu-me então autorização para ir do estacionamento ao restaurante, ter com o meu pai e restantes pessoas.

Passado uns minutos, o meu pai vai ao carro ver como está o bebé e, não me vendo, pergunta por mim. Ao que a minha mãe responde:

– A Carolina? Então.. Foi ter contigo.

Imaginam, não imaginam?

O meu pai volta ao restaurante e, ao avisar que não sabe da filha de 3 anos, os empregados desatam a procurar-me, em pânico – era a primeira vez que jantávamos ali, ninguém nos conhecia.

No final, já comigo a salvo, confessaram que o pânico tinha um motivo muito forte, que não quiseram revelar no momento: além de ser o algarve – por si só já toda a gente saber ser bastante turístico e com todos os perigos associados – o local estava repleto de poços e piscinas que, por ser verão, se encontravam destapadas!

Afinal, como me encontraram?

Foi o meu pai que teve o clique de voltar ao carro e tentar perceber como raio me poderia ter perdido. Foi para perto do carro e reparou que havia dois caminhos:

  • O caminho iluminado que dava acesso ao restaurante;
  • O caminho completamente às escuras para onde eu poderia ter ido e ter temido voltar quando me apercebi da escuridão.

Uma vez que eu não cheguei ao restaurante, ao se aperceber deste segundo caminho, correu nessa direção. Mais à frente ouviu cães e pensou “tão escuro e com cães a ladrar, ela não voltava para trás” e continuou a correr e a chamar por mim.

Alheia a esta situação, estava eu que, de facto, me devo ter assustado com o escuro e/ou os cães, não me recordo. Só sei que estava encostada a uma árvore, a chorar, quando apareceram 3 senhoras, com pronuncia inglesa, e perguntam “tu mamã e tu papá?” e eu, alheia a outras línguas, chorei um “eu não sei, eu estou perdida” e, logo a seguir – tendo eu 3 anos não sei se foi logo a seguir ou meia hora depois – ouço uma voz a chamar por mim e digo às senhoras que é o meu pai.

Era mesmo e explicou-lhes, em inglês, o que se tinha passado e o motivo de eu estar ali sozinha no meio da noite cerrada!

Mais tarde, após contar a alguém, oiço a minha mãe – que ainda hoje se lembra da roupa que eu tinha vestida – dizer “Tu sabes lá o susto que foi. E isto está ela a contar agora.. Durante algum tempo ela não falava do assunto. Só dizia que não se lembrava de nada”

Confesso que não me lembro de dizer que não me lembrava, nem sei se alguma vez esqueci realmente a situação. Para mim sempre foi nítido que parei a chorar junto a uma àrvore, à noite – vieram as senhoras – o meu pai vir a correr a chamar por mim.

Não me lembro se nalgum momento tive medo de estar sozinha – devo ter tido e por isso parei na tal árvore. Não faço ideia se estive muito ou pouco tempo sozinha e com as senhoras..

Sei que com esta história ganhei o rótulo eterno de criança/ adolescente/ adulto mega desorientado. Consegui perder-me entre o estacionamento e o restaurante, virando para um caminho não só desconhecido como completamente escuro! As crianças são, por natureza, curiosas mas bolas, era noite cerrada.. Curiosidade não deve ter sido.


O tempo passou, eu cresci, o rótulo acompanhou-me e, com ele, umas quantas histórias a provar que eu sou, de facto, mega desorientada. Nunca mais me perdi a sério (não a este ponto de me assustar ou assustar alguém) mas é frequente saber onde estou, para onde quero ir mas não saber que caminho escolher e, não raras vezes, já dei mil voltas a mais entre um ponto A e um ponto B, sabendo sempre por onde passo mas sempre sem saber qual o caminho para onde devo virar.

De referir que adoro a pessoa que inventou o GPS. Acredito que tenha sido graças a essa invenção que nunca mais me perdi a sério.

Mas continuando para outra história que vos quero contar, desta vez como mãe..

Tinha a Caetana 2 anos quando nos fez algo parecido. No entanto, o susto foi todo nosso, ela fez tudo com consciência e orientação.

Estávamos nós, os 3, numa loja de um retail park – sim, lojas exteriores, com pouco passeio e estrada logo ali. Quando, à procura de um artigo de outro tamanho na loja online, eu fico a fazer o pedido no telemóvel e o pai vai vestir o casaco à miúda. Vai ao fundo do corredor e volta, dizendo que não sabe dela.

Eu, descansada da vida, respondo “ai, deve estar aí ao fundo e deves ter-te desencontrado dela” mas vou também à procura.

Eu de um lado do corredor, o pai do outro e nada de Caetana. Há uma porta para o armazém da loja, espreito e nada.. Começamos a chamar na loja, outras pessoas olham para nós, percebem que procuramos uma criança, olham à volta e ninguém avista uma criança sozinha.

Perguntamos no balcão, junto à entrada e ninguém a viu sair. Mas ela era tão pequenina que facilmente passava (como passou) sem ser vista. Portas automáticas, que abriram à sua passagem.

Saio para a rua, espreito loja ao lado e café a seguir e nada de Caetana..

O pai tem um clique, sai disparado em direção ao.. Carrinho das moedas que se encontrava a seguir ao café onde não a vi.

E lá estava ela, bem habituada como sempre, a brincar no carrinho, sem moeda inserida.

O pai vai tirá-la e ainda sai de lá aos berros porque ela só queria o “carrinhoooooo”

Publico nas redes sociais e telefona-me uma prima, 9 anos mais velha, que estava no jantar onde eu me perdi e que se lembrava bem da aflição de todos até me encontrarem e diz-me:

– Vê o lado positivo. A Caetana não sai a ti. Desapareceu mas foi direita ao carrinho. Se fosses tu, tinhas saído na direção contrária e só paravas sabe-se lá onde.. Pelo menos já ficaste a saber que a miúda tem orientação.

Similar Posts

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *